Sermos guia das nossas crianças, sem seremos seus criados, nem os seus chefes.
Guiar é diferente de mandar, exigir, esperar obediência cega.
Guiar também é diferente de fazer tudo pela criança, não solicitar a sua colaboração e achar que ela não é capaz e então fazemos nós.
Numa primeira fase acredito que guiar, está mais relacionado com a forma como vemos a criança, quando realmente formos capazes de ver o ser, capaz, que ali existe na sua forma única de se expressar, entenderemos que estamos ao mesmo nível sem confundir papéis.
Nós os pais, eles os filhos, sem permitir-mos que o contrário aconteça, mas também sem deixar que a minha vontade prevaleça sempre e sem razão em cima da da criança.
Guiar a criança é saber que estamos ao seu lado na sua jornada, nem á sua frente nem atrás dela. Estamos ao seu lado.
Daremos a mão quando necessário, mas também permanecemos imóveis e em silêncio quando tudo em nós (e nos outros) quer intervir.
Plantamos sementes, mas permitimos que cresçam e brotem as suas flores.
Alguns passos e reflexões podem ajudar-nos nesse caminho. é uma constante, é um trabalho diário e que pede consciência plena. Mas é possível.
1º Dar espaço
Dar espaço para que a criança se movimente, explore e seja ela do jeito que tem de ser. Dar espaço para que ela tome as suas iniciativas, demonstre a suas vontades e os seus interesses. Dar espaço.
A criança precisa se sentir livre dentro dos seus próprios limites, há todo o ambiente que lhe mostra os limites, não deverá ser o adulto a fazê-lo, será a função do adulto cuidar para que o perigo excessivo não esteja ao alcance, mas o adulto não controla a criança no seu ambiente ele controla o espaço em que é possível a criança ser livre.
Não só fisicamente, mas nas palavras, nas observações, dar espaço implica o silêncio muitas vezes.
2º Estar disponível
Criarmos com naturalidade uma forma de estar, onde estamos disponíveis mas a criança não depende, mas ela alcança-nos, sempre que necessário. E ela sabe que estamos ali. As tecnologias retiram-nos muitas vezes essa disponibilidade e eles sabem.
3º Ser respeitador, amável e claro na suas expectativas e limites
O guia também é uma pessoa, também tem os seus limites, a criança também. Sermos respeitadores pelo limite da criança e sermos amáveis para lhe transmitir os nossos limites de forma clara e consistente. Quantos mais forem os limites mais confusa ficará a relação, principalmente se estiver em desiquilíbrio. Definir bem o limite e transmiti-lo à criança de forma amável e firme. Receber os seus limites e aceitá-lo de forma amável e respeitadora.
4º Assumir a sua responsabilidade
Para tudo há uma consequência na vida. Castigo não é opção (falarei deles noutro texto).
Eu não me fecho num quarto escuro de cada vez que sei que me "portei mal". Eu assumo a consequência do meu ato. Com a criança será igual. Quanto mais direta a consequência mais fácil será ela ligar as duas coisas e da próxima vez se corrigir na forma como está a fazer. Estarmos preparados para guiar a criança é também permitir que ela assuma os erros, não através de nós ou perante a superioridade do adulto, mas de si para si. Ela com o erro dela.
Não dizer sempre como corrigir o erro também ajuda, para que a criança corrija sem medo da reação do adulto, mas porque entende que não está certo a forma como fez.
5º Cuidará do ambiente para que ela prospere segundo os seus interesses e vontades
O professor ensina o que aprendeu, o guia prepara o ambiente para que ela descubra as suas aprendizagens por si mesma. Ele cuida do ambiente para que este satisfaça todas as necessidades da criança, seja necessidade de aprendizagem ou desenvolvimento, seja necessidade básica de auto-cuidado.
Não é que o guia não faz nada, ele passa a ter a missão de ser um agente mais disfarçado no meio da criança, que atua pelo meio que prepara em vez se ser o centro de atenção da criança. Ele faz muito, faz até mais, mas sem necessidade de reconhecimento.
6º Pára, Ouve e observa
Para que consigamos preparar o seu ambiente, para que possamos estar disponíveis para a criança de verdade, para que essa criança prospere, há que PARAR, OUVIR e OBSERVAR. É um movimento diário, é um momento de si para si mesmo, com o foco de desligar julgamento e achismos e focar no que realmente se vê, a criança.
Pára, sempre que o caos instalou-se mas também sempre que o silencio abunda, mas também e muito importante quando a criança chama por nós, parar e olhar nos olhos.
Ouve, sem julgamento, sem distrações.
Observa, o movimento, a vontade, as reações, as necessidades. Aponta, para que depois haja uma reflexão.
Pessoalmente gosto de refletir sobre as minhas ações ao final do dia, escrever o que senti e o que posso mudar enquanto adulto.
7ª Percebe a intenção antes de reagir
A tendencia é sempre REAGIR. o impulso que brota sem darmos conta. No seguimento do ponto anterior, pára e percebe a intenção. Há sempre uma intenção por detrás de cada ação. e nunca é contra nós ou sobre nós. É sempre por uma necessidade interna que tantas vezes desconhecemos a causa.
Muitas vezes dou conta, de ir reagir a uma determinada ação, quando consigo manter a presença, paro, observo e a maioria das vezes acabo por perceber que a minha reação não iria trazer nada de benéfico, pelo contrário.
8º Ajuda a procurar solução em vez de dar a resposta pronta
Sempre, tanto quanto possível. a criança é curiosa por sua natureza, ela descobre o mundo e o que a rodeia a todo o instante, saciar-lhes a curiosidade dando respostas prontas, além de não saciar a curiosidade ainda gera um dependência de resposta fácil e limitadora, como um lugar de respostas absolutas, cabe-nos levá-los a questionar e a procurar as suas próprias respostas. Este processo pode e deve começar bem cedo. Se permitirmos a criança pequena muitas vezes não pergunta: ela explora; deixar explorar, mexer a terra, parar para observar um insecto é meio caminho para estarmos a permitir que ela encontre as suas respostas.
9º Silenciar
E por último, silenciar. falamos demais, intervimos de mais, interrompemos demais. A criança não precisa. Quanto mais silencio fizermos mais a criança se permite silenciar e fazer o seu caminho por si mesma. Estar com a criança de forma consciente e presente, não significa que precisemos de falar constantemente ou de aprovar o que ela está a fazer, por vezes um simples sorriso que ela possa procurar em nós já diz tudo.
A minha crianças tem me ensidado a ser as suas guias, claramente que é uma travessia cheia de precalçoes e dias menos bons, mas estar consciente do que é importante do que lhes faz bem, a elas e a mim e qual o meu caminho enquanto guia, ajuda-me a por os pés no chão, silenciar e recomeçar.
" ...expressa claramente um desejo comum a todas as crianças de só serem ajudadas por adultos quando esta ajuda for realmente indispensável." Maria Montessori, em Montessori em Familia